Nada

"Olh'á bolinha quentinha!
Estão a acabar!.." - gritava o senhor das bolas em plenos pulmões.
"Desculpe!...Por favor...Aqui..." - esbracejava o indivíduo ansioso por sossegar o menino que não se calava por nada.
Depois de muita agitação de braços, chega-se o senhor das bolas: "Ora diga faxavore! Quantas são?!".
Como ela adorava a candura dos comerciantes da zona.
"Duas, por favor. Quanto custa?" - perguntou o indivíduo quase a medo do valor que poderia vir dali.
"Ora...são nada mais nada menos que quatro euros. Uma coisa de nada, senhor! O negócio está mau sabe?!..." - o senhor das bolas mostrava-se um nada ralado com a vida.
Mau ficaria o porta-moedas do indivíduo, assaltado em público como se nada fosse pelo senhor das bolas. Não era nada com ela, mas não conseguiu conter o pasmo no seu rosto ao ouvir bárbaro custo.
Perdida nos seus pensamentos já só ouviu o "De nada!" do indivíduo, agora indignado com o preço das bolas hoje em dia. Parecia-lhe até que ele resmungava consigo mesmo em surdina.
Ela não dava nada por aquele mês. O certo era que o calor abundava por aquelas bandas.
Os dias de descanço esgotavam-se. Mas já não havia nada de novo para explorar. Os dias tranquilos chegavam ao fim assim como o falso Verão e quanto a isso, nada feito.
A areia reflectia os escaldantes raios de sol. No entanto, o miúdo corria para o mar como se nada fosse. Antes do mergulho, grita pelo pai - "Anda pai, está boa!!!". O garoto gritava por tudo e por nada, não havia pachorra...
Tentada pela cobiça da satisfação do catraio, decide-se a dar umas braçadas. A certo ponto, sem perceber o porquê, dá por si a partilhar o mesmo metro cúbico de água com o miúdo, que por sinal esbraceja mais do que nada.
"Devia ensinar a sua criança a nadar!".
Atrás de si, está uma senhora comicamente vestida à anos 60, sem faltar qualquer adereço, inclusive a touca rosa floreada de borracha. Sente-se envergonhada com o comentário, não por o miúdo não saber nadar, mais pelo facto de estranhos a julgarem mãe de um pirralho mimado. Resolve esclarecer a situação, uma vez que o excelentíssimo e despreocupado pai o vigia à distância, estatelado na sua bela cadeira de praia.
"Peço desculpa...mas este miúdo não me é nada minha senhora...". Apesar do esclarecimento a senhora não se dá por vencida, "Olhe...mas não deixa de nadar mal!...Está a molhar-me toda. Não há respeito!!".
Depois do comentário daquela arrogante senhora, ela dá por encerrada a troca de palavras. "Não vale a pena!", pensa para si mesma. Vira-se para o miúdo pelo qual começa a ter uma certa empatia: "Esbraceja para aí miúdo. Tu chegas lá!" e dá-lhe o seu melhor sorriso.
Sem ela dar por nada, o pai da criança observou bem de perto todo o teatro e está fixado na rapariga que foi simpática com o seu filho, enquanto este clama pela sua atenção total para o ver nadar. "Paiiiii, oh pai!...Olha! Já sei nadar!...Oh pai!..." - o miúdo repara que o seu pai está já dentro de água e se aproxima não dele, mas da rapariga que o defendeu. Ao que pergunta, "Que estás a fazer pai?". Ao que este lhe responde,
"Nada Jaime, nada!..."

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