Valor

"Estás a perder qualidades..."

Jamais uma frase lhe tinha tocado com aquele impacto.

O quarto nunca lhe tinha parecido tão grande como naquele momento. As palavras ecoavam pelo tecto, rodeavam-na como espíritos inquietantes. As lágrimas escorriam pelas suas faces tão naturalmente como a água de uma fonte cansada.

Concluía agora que pior que perdê-las, era nunca as ter possuído. O medo apoderava-se dela como as labaredas da lenha num fogo descontrolado.

Uma dor súbita no estômago retira-lhe as forças, como se atingida por um potente soco. As pernas fraquejam. Deixa-se cair na carpete encarnada, encardida, cor à muito comida pelo sol. O mesmo sol que presenciou silenciosamente as suas qualidades. Tudo à sua volta era dourado, iluminado pela luz de final de dia. A dor insiste em permanecer, alastrando ao esófago deixando-a sem respiração. A última coisa que vê naquele dia é o seu reflexo no tecto.

Uma alma perdida de qualidades ausentes...